sábado, 1 de agosto de 2009
Publico ou não publico?
Sienna Miller
É por estas notícias que quem teve um cancro nunca pode dizer que está curado ou que o venceu. Quem teve um cancro sabe que a vida nunca mais será a mesma. Que mais tarde ou mais cedo ele pode aparecer. O medo está sempre presente. É a doença do medo. Eu esqueço-me imensas vezes que já tive um cancro. Sim, eu, Kitty Fane Maria, confesso aqui que tive um cancro. Muitas vezes não acredito nisso. Felizmente, ninguém acredita nisso, a não ser os que privam comigo. Mas a minha pele, na zona do pescoço, onde ninguém vê, não me deixa mentir - está cheia de cicatrizes. Cicatrizes deixadas pelas cirurgias a que fui submetida. Cicatrizes que me deixam cheia de complexos e que tapo insistentemente com o cabelo. Cicatrizes acentuadas por trinta e nove sessões de radioterapia. Essas são as visíveis. As cicatrizes que doem mais não se vêem. São as psicológicas. Sinto-as todos os dias.
Nunca o aqui confessei abertamente porque odeio os lugares comuns do costume - os olhares de pena e de comiseração, as palavras de força e de coragem. Mas já há muito que o queria aqui partilhar, sobretudo pelas pessoas que me lêem e que estão neste momento a passar por um momento menos bom. E eu sei o quão importante foi, na altura, ouvir as palavras de pessoas que tinham passado pelo mesmo.
Queria dizer que é possível ser feliz depois do cancro, ainda que se viva sempre ensombrada pelo seu reaparecimento. Queria dizer que toda a gente deve estar sempre atenta a todos os sinais do seu corpo. Eu apenas tinha um nódulo atrás da orelha. Não tinha dores. Não andava amarela. Não tinha perdido peso. Não me sentia cansada. Não. Sentia-me óptima. Melhor do que nunca. Estava numa das melhores fases da minha vida em todos os aspectos. Apenas tinha um nódulo atrás da orelha. Coisa pouca, pensava eu.