quarta-feira, 1 de maio de 2013

Do dia do trabalhador

Eu evito ao máximo falar aqui da minha profissão, por achar que não devo misturar as coisas. Há uns anos falava mais e é verdade que raramente achei que valia a pena fazê-lo. Porque para a sociedade em geral, os professores são seres que estão sempre de férias. Ganham bem e saem cedo. Não fazem rigorosamente nada. Só sabem queixar-se, apesar de terem uma vida para cima de espetacular. Tudo isto é agravado se formos professores das escolas públicas. Oh meu Deus, não fazem nada, os alunos não aprendem nada e a culpa é deles, seres inúteis. E depois sai o ranking a "comprovar" isso, as escolas privadas sempre em primeiro lugar. Como se fosse possível fazer-se um ranking de uma coisa que não parte em igualdade,que não trabalha em igualdade, já para não dizer que os alunos não são uma mercadoria que trabalhada dá sempre o mesmo resultado. Mas isso são contas de outro rosário.

Sou professora na escola pública com muito orgulho há uma eternidade de anos. Nunca me queixei das condições em que trabalhava. De vez em quando era capaz de me queixar do frio no inverno e de os alunos terem de trabalhar de casaco vestido ou de mal conseguirem pegar no lápis com as mãos geladas, ou do insuportável calor que transforma as salas de aula em saunas no verão. Mas no fim tudo, tudo isso é insignificante. Deem-me alunos com vontade de aprender, dêem-me uma sala de aula, deem-me uma fotocopiadora, deem-me um computador com acesso à net e com uma impressora a funcionar, sem ter de andar a comprar tinteiros do meu bolso, e eu sou uma professora feliz. Sou uma profissional feliz. A verdade é que ultimamente apenas tenho alunos e uma sala de aula para trabalhar. As impressoras da escola avariaram, foram avariando umas atrás das outras, e ninguém competente para resolver apareceu. A ligação à internet foi-se lentamente até desaparecer totalmente. E a gota de água final, foi a fotocopiadora, que avariou e não se vê miragem de alguém para a arranjar ou para dar uma nova. Mas como é possível uma escola funcionar sem uma fotocopiadora? Pois, não sei. Já não falo das turmas que podem ir até 30 alunos (para contrastar com as dos colégios privados que muitas vezes nem passam dos 15, ai o ranking e tal). Já não falo da papelada que nos obrigam a preencher por tudo e por nada e que na prática não dá qualquer tipo de resultados. Já não falo de outras coisas mais. Apenas destas coisas básicas sem as quais, nos dias de hoje, um professor não pode passar para preparar as suas aulas.

13 comentários:

Anônimo disse...

Eu tenho vários amigos professores e sem bem os dramas e as chatices (e algumas alegrias) por que passam.

Sempre entre Viagens disse...

Eu "cresci" na escola e estou rodeada de professores, bem sei daquilo que falas. A sociedade em geral só vê os dias de férias a mais depois de acabarem as reuniões na paragem de Natal e da Páscoa e o Verão prolongado porque não há exames todos os dias. Esquecem-se que enquanto se trabalha não é das 9h às 5h. É preciso vir para casa preparar aulas, materiais e testes, e virar fins de semana inteiros a corrigir oito turmas de testes! Quem dera a muitos professores ter só 22 dias úteis de férias mas encerrar às 5h!

Hibiscus disse...

Eu sinceramente desisti de discutir isto. A população devia ter vergonha na cara quando falam mal e deitam as culpas "de tudo" para cima dos professores. Deviam ter vergonha na cara quando vão às escolas chamar nomes aos professores e insultar porque o seu filhinho fez asneira e é um mal criado e a professora pós simplesmente de castigo. Deviam ter vergonha por incentivarem os filhos principalmente os mais pequeninos a desrespeitarem os professores , mas também hoje em dia as crianças nem aos pais respeitam quanto mais haveriam de respeitar os outros. Eu já vi cada coisa que até fico parva! Claro que como em todas as profissões do mundo há bons e maus profissionais mas isso é outra história.


Parabéns por teres uma das profissões mais importantes para o desenvolvimento de um pais e de uma pessoa.

Anônimo disse...

os professores que tenho neste momento, já á dois anos, são modelos que pretendo seguir. nós damos mais valor do que aparentamos. todos os dias dou um beijo aos meus professores, e agradeço-lhes tanto por serem como são. nem tudo é mau.. ;)

pensativa disse...

Também eu "cresci" numa escola e estou rodeada de professores. Os tempos "bons" já passaram. Es condições de trabalho estão cada vez mais difíceis. Agora querem uma fotocópia e não tem, tempos foram em que traziam a enciclopédia de culinária da sogra para fotocopiar .. mas isso são contas de outro rosário.
Deixe-me agora contar um episódio surreal que se passou na turma de um dos meus filhos que está no 5º ano. A turma é composta por 16 alunos , porque 2 são hipercativos e daí o nr reduzido. Certo dia um desses colegas estava inquieto como de costume e a professora de português deu-lhe um estalo na cara!, Ora com motivo ou sem motivo jamais um professor pode ter semelhante atitude. Mas o mais grave, fez os restantes alunos fazerem uma participação do colega, em que os obrigou a escrever precisamente ao contrário, que tinha sido o aluno a agredir a professora e todos os alunos assinaram. Mais ainda, chantageou emocionalmente os alunos para não dizerem nada em casa, porque o marido está desempregado, já não tem carro e que não podia ficar desempregada ... Não é surreal?!?!

Sara Silva disse...

Como em tudo há bons e maus profissionais, o mal da sociedade é insistir em querer meter tudo no mesmo saco. Não podemos comparar o incomparável porque é totalmente diferente dar aulas a 15 alunos e dar a 30. Eu não sou professora, mas penso que basta pensar um bocadinho nas coisas para perceber que deve ser totalmente diferente.

Fernanda disse...

Exatamente! Nem vale a pena dizer mais nada, apesar de muita coisa poder ainda ser dito para desfazer esse tais "mitos urbanos". Enquanto os portugueses sofrerem de invejite aguda e, em lugar de lutar pelos seus direitos cobiçarem a posição dos outros que, segundo eles, estão sempre melhor, têm mais regalias, etc e tal e desejarem que lhos tirem, este país estará sempre na cauda, não da Europa, mas do mundo!

Bafejada pelas Musas disse...

Eu trabalhei num privado e este ano estou pela primeira vez na escola pública. Estou como tu, adoro o que faço e pouco preciso para o fazer e se há coisa que me enerva é essa história dos rankings. As pessoas falam de forma leviana e sem conhecimento de causa. Ninguém faz ideia do que tu própria afirmaste e muito menos de coisas que eu sei (por ter estado no meio) como, por exemplo, que os colégios mais conceituados do país, antes dos exames,seriadores de escolas e de alunos, "convidam" os alunos com menos capacidades e médias menores a realizarem as provas nacionais como "alunos externos". Assim, a fraca figura que parte dos seus alunos irão fazer não entrará na média do colégio, ficando assim o mesmo com uma cota fantástica a nível nacional. Ora a levar apenas os bons alunos a exame, qualquer barraca educativa o consegue!

beijinho

Cristinix disse...

Sou professora, hoje já dei teste a uma turma, mais logo vou dar a outra, logo fim de semana vai ser passado a corrigir cerca de 50 testes. Segunda feira vou dar teste a outra turma, e por isso no fim de semana também vou ter que fazer este teste. Além de ter que preparar aulas para a semana...
Isto é um exemplo: quem me dera ter um emprego de sair às 5.
Beijinho.

Holly Golightly disse...

Estou-me a tirar o mestrado na área de ensino e já ouvi imensas "bocas" como tu disseste: " Não vais fazer nada da vida" ou então "ensinar? isso qualquer um faz" .
Detesto e põe-me doente a falta de valor que dão ao trabalho de um professor e ainda não estou sequer a trabalhar. O que fará quando chegar a situações (quase) extremas como a que estás a passar com a falta de material para poder trabalhar feliz.
Bem, esperemos por dias melhores :)

ADEK disse...

Nos comentários de jornais online vejo muito mais ódio aos médicos. Acham que não fazemos nada, somos preguiçosos e ganhamos balúrdios. Não tenho visto tanto disso em relação aos professores, mas compreendo que estejas mais atenta. E é uma parvoíce... Há bons e maus profissionais (os "preguiçosos") em todas as áres, mas as generalizações que se vêem por aí dão cabo de mim. Estou solidária! E muitos parabéns por apesar das contrariedades continuar com motivação para dar o melhor de si. Só assim consigo manter a esperança no meu país.

Juanna disse...

Bom, eu não conheço a situação em Portugal mas deixa-me contar-te o ponto de vista de uma mãe em Espanha.

Em 365 dias do ano, cerca de 120 não há aulas, entre férias e feriados e dias não lectivos. Os dias não lectivos são todas, mas mesmo todas as pontes que possam existir no ano, fora umas sextas e segundas que às vezes inventam.

Os professores chegam a correr às 09.00 e saem muitíssimo pontualmente às 16.00 (eu vejo-os a sair em passo apressado). Olhando para o horário da minha filha mais velha, vejo que das 7 horas que passa na escola, 2 horas e meia são de recreio - 2 de almoço e 30m de recreio a meio da manhã.

Aqui há umas semanas falaram de aumentar o horário dos professores de 35 para 40 horas semanais e foi um ai que d'el rei.

Considerando que nenhum pai tem mais de 25 dias de férias por ano e que a esmagadora maioria trabalha mais de 45 horas por semana e traz ainda trabalho para completar em casa e aos fins-de-semana, podemos concluir que isto traz uma imagem controversa dos professores para os pais. Sobretudo porque utilizam imenso o argumento do "ver os testes", embora não haja testes todos os dias, nem todas as semanas. Preparar as aulas? Mas isso fazem as pessoas todas quando têm um emprego, preparam o trabalho do dia seguinte. Aturar criancinhas? Aí estamos totalmente de acordo, são insuportáveis e malcriadas como nunca. E choca-me a reacção dos pais, como se os seus filhinhos fossem umas vítimas quando, na maioria das vezes, são pequenos imbecis mimados.

Mas claro, isto é o meu ponto de vista, como mãe e como pessoa que não está dentro do sistema. Corrijam-me se estou errada!

Rafa disse...

Minha querida,
Lembro-me de há uns anos a Oprah ter dito que o "professor" era a profissão preferida dela! E, ao que parece, também nos EUA é uma profissão não tão bem paga quanto isso e sem particulares regalias. Então ela fez um programa dedicado só a eles, com uma plateia constituída inteiramente por professores/professoras. E deu-lhe montes de prendas. Não foram carros, mas foram coisas giras. :)

De qualquer forma, isto para dizer que, ainda assim, mesmo estando o nosso país com excedente de licenciados nas mais variadas áreas de ensino (e atrevo-me a dizer - mal licenciados*), a verdade é que continua a pertencer ao núcleo restrito das profissões de topo, isto é, as profissões dos filhos que os pais mais se orgulham de dizer aos amigos: engenheiro, advogado, médico, arquitecto e professor. Os cinco magníficos. :)

Eu tenho extraordinárias memórias de alguns professores (até hoje sei o nome dos mais de 70 professores que me passaram pela frente)

*Em relação aos mal licenciados, acho muito mal que as pessoas licenciadas em Educação Visual/Desenho, vertente ensino possam dar aulas ao 1.º ciclo (aulas gerais). Lembro-me, ainda com terror, que uma antiga colega me perguntava, quando começou a dar aulas, se "estiveste" era separado (estives-te) ou junto. E foram estas pessoas que andam a formar as nossas crianças. :(

Beijo!